67. Um fervedor de leite na sala de aula. Husserl e Heidegger.
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Um fervedor de leite na sala de aula
64. Husserl tentou romper com o dualismo idealista moderno, tendo colocado a consciência intencional como não substancial (não ‘res cogitans’), consciência de qualquer coisa, mas sem tempo nem mãos, e foi por isso talvez que não conseguiu escapar totalmente à oposição sujeito / objecto: suficiente talvez para as matemáticas e para a lógica, que eram os seus principais interesses ‘científicos’ - é discutível que sejam ‘ciências’, no sentido laboratorial do termo -, mas não para estas, em que a experimentação é estrutural. Ele não terá atingido assim o que o seu discípulo percebeu na abertura que a intencionalidade da consciência tinha operado na sua fenomenologia. Tendo percebido também o impasse do mestre, Heidegger decidiu passar ao Mundo, pulsionado pela descoberta de que o Ser é mais largo do que o ente (§ 18). Mais do que uma diversidade trivial, há uma diferença que as articula em horizonte, dada previamente a elas, a famosa diferença ontológica entre o Ser e cada ente. Seja um exemplo desta ruptura entre os dois grandes pensadores. Uma vez em que tinha que falar desta questão numa aula, coloquei na devida altura um fervedor de leite em cima da mesa da sala de aula, dizendo aos meus alunos, meio espantados, meio divertidos: ‘eis aqui o objecto da fenomenologia de Husserl!’ Numa sala de aula, o fervedor está fora do seu contexto usual, fora do seu horizonte, é vista imediatamente por toda a gente. Mas se, pelo contrário, se entra numa cozinha, onde ele está ao pé de outros utensílios, não se dá por ela mais do que por outro utensílio qualquer, vê-se antes de mais a cozinha como horizonte, incluindo as pessoas que lá estão a trabalhar, talvez os utensílios que elas estão a usar. Como Heidegger escreveu: “estas ‘coisas’ [a caneta, a tinta, o papel, a mesa, as portas, o quarto] não começam por se mostrar por elas mesmas, para depois constituírem uma soma de realidade própria para encher um quarto [à maneira de Husserl]. O que se encontra antes de mais, sem ser visto tematicamente, é o quarto, [...] mas também não o ‘intervalo entre quatro paredes’ num sentido espacial geométrico, mas um utensílio de habitação” (Être et temps, 1985, p. 68). Esta cozinha como horizonte e as pessoas que lá estão e os utensílios, utilizados ou arrumados à espera de serem utilizados uma vez por outra, este conjunto (que se prolonga inddefinidamente: casa, vizinhança, cidade, emprego, etc.) de pessoas que fazem coisas com utensílios diversos, em 1927, no seu primeiro grande livro, é, ao nível ôntico, o que Heidegger chama o Mundo (idem, p. 65). E cada humano é definido como ser-no-mundo. Se é na véspera dum dia de festa, trabalha-se muito na cozinha, este Mundo (as pessoas incluídas) não deixa ninguém tranquilo, incita cada um à sua tarefa, é ‘activo’, impulsiona as pessoas sem que se lhe possa fugir. É pois mais do que um horizonte ao longe, ‘passivo’.
O Dasein é pois, ao nível ôntico, este mundo em que ele está aberto, agora e aqui. Determinismo, fatalismo? Não, visto que ele não pode ser este ‘aqui’, no exterior, senão porque tem uma pré-compreensão: na cozinha, ele não é uma marciano que caiu do céu, trabalha a partir do que já sabe, das receitas, que conhece: são a sua palavra e os seus comportamentos que são a sua abertura. E que respondem a uma outra abertura. Com efeito, para que a verdade de uma coisa seja, se desvela a um humano, é preciso o acordo mútuo duma dupla abertura doada pelo ser: este tanto dá a coisa como o humano no seu comportamento (aprendido) em relação à coisa[1]. Ao nível (ôntico) das aberturas dos próprios entes, quando por exemplo se faz uma sopa de legumes: as batatas, a que os franceses chamam com graça maçãs de terra, dizendo que esta as dá, e a água (uma fonte, é a terra que se abre), as cenouras (a terra fê-las crescer e abriu-se sob o seu impulso), o sal (nas marinhas abertas, o sal depositou-se), o azeito pressionado das azeitonas (as oliveiras como as cenouras, as azeitonas vêm das flores que nelas se abriram), tudo isto é metido numa grande panela aberta (antes de se a fechar com a tampa), depois abre-se o fogão (colocado na abertura da chaminé), saem o gás e o lume, a cabeça do fósforo abre-se numa chama, e assim de seguida. E o cozinheiro olha com os olhos bem abertos, claro, olhando cada um dos seus gestos: as mãos, para pegarem na faca e cada cenoura ou para acender o lume, não podem ficar fechadas, abre os braços quando tem que pegar na panela com as duas mãos, etc. Com efeito, ele tem de saber abri-los, os olhos e as mãos, de maneira a deixar ser o que se recebe, batata ou panela ou lume, deixá-los ser segundo o seu ser, tal como eles são (segundo as suas leis empíricas, diriam os cientistas): é coisa que se aprende e que exige habilidade. Também falar ao outro implica que, com os olhos abertos, se lhe dirija a palavra por aberturas e fechares muito seguidos da garganta e da boca, que se escute sem se fechar os ouvidos, que um sorriso abra o rosto ou que, se um ar zangado o fecha, esse fechar seja ainda uma espécie de abertura, apesar de zangada; para se apertar as mãos, elas foram primeiro bem abertas, para um abraço, os braços abertos envolvem o pescoço do outro, para um beijo, os lábios entreabriram-se. Todas estas aberturas ônticas são dadas pelo ser como possibilidades, e para que essas possibilidades não sejam determinismos, obrigações, a própria doação dissimula-se, esconde-se, vela-se. Desvelar, permanecendo velado, é a aletheia, a verdade em grego heidegeriano. Esta abertura supõe no cozinheiro uma pré-compreensão, recebida dos seus percursos passados, são pressupostos, preconceitos (não é pejorativo!) que o seu passado depositou nele, lhe ensinou: eles dão-lhe um certo recuo sobre a situação[2], um certo retiro, poder-se-ia dizer, no seio da abertura, visto que se trata também dum certo poder escondido sobre o mundo, trata-se de possibilidades de agir (‘possibilidade’ é de quem ‘pode’, tem poder de) que são diferentes para cada um segundo as suas capacidades, hábitos, talento, saber fazer adquirida ao longo do tempo. O possível é o futuro aberto na finitude do nosso mundo e dos seus usos, das nossas capacidades, das nossas possibilidades de o compreender e de o usar. Aberto pelo ser, o mundo-terra – a que pertence cada ‘ser-o-aí’ – é também um dos frutos temporais: já que, nascidos e mortais, a vida joga sobre nós (tem-se que comer, fazer isto ou aquilo, repousar-se: é a este imperativo que responde o cuidado através de usos) num tempo que não volta nunca para trás, finito na sua própria abertura a que chamamos futuro. Finitude ou liberdade habitante – com os outros, em usos – na terra que os deu e os reitera sempre, finitude entre nascimento e morte, liberdade de escolher segundo os seus possíveis: eis o que o ser dá como temporal e, dando, esconde-se, esconde o seu poder como condição da própria liberdade que ele dá, deixa-a ser livre, autónoma. Esta é a descoberta inestimável da Heidegger, esta diferença ontológica entre os entes, entre os quais os humanos, e o retiro de sua doação: o não determinismo no coração da finitude.
[1] O cap. 2 de A essência da verdade faz a transição do “conceito corrente de verdade” como concordância entre o intelecto (ou enunciado) e a coisa para o comportamento, que “se caracteriza pelo facto de, estabelecendo-se no seio do aberto, mantém-se nele constantemente unido ao que é manifestado como tal”, ao que no Ocidente é “experimentado como ‘o que está presente’, dito o ‘ente’” (De l’essence de la vérité, Vrin, 1948, p. 76-7). É o ‘sentido’ husserliano (do objecto enquanto tal objecto, constituído pela consciência) que é assim deslocado para o comportamento do ‘ser-o-aí’ com os utensílios: “a aperidade do humano diferencia-se segundo a natureza do ente e o modo do comportamento” (ibidem). Seja o exemplo dum mecânico de Alcácer do Sal que passou a tarde toda em vão em torno dum motor avariado e que, às 4 da madrugada acorda, iluminado, e corre à oficina a confirmar o que ‘des-cobrira’. Percebe-se que não foi ‘ele’ o descobridor, mas que terá sido o motor e seus sintomas, juntamente com as suas tentativas da tarde, que se lhe des-cobriu, a ‘ele’.
[2] “Entregar-se ao [carácter de ser desvelado], não é perder-se nele mas desdobrar dum recuo diante do ente, afim de que ele se manifeste no que ele é e como ele é. […] Antes de tudo, […] a liberdade é o abandono ao desvelamento do ente enquanto tal” (Heidegger, De l’essence de la vérité, Vrin, 1948, pp. 84-5).
(§ 64 de Heidegger, pensador da Terra)
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66. La philosophie avec sciences au XX siècle - §§ 66 - 75e.
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66. La philosophie avec sciences au XX siècle - §§ 66 - 75e.
Oscillation entre répétitions de routine et événement
66. Le retrait strict
concerne une partie de l’assemblage, il en retient le trop énergétique
en des répétitions que l’on peut dire automatiques, car en dehors de
toute interférence directe : dans le cas de la voiture, par exemple, il
est impossible de mettre la main dans le cylindre où se produit
l’explosion de l’essence ; le noyau atomique est inexpugnable dans les
conditions terrestres de température[1]
;les biologistes défendent comme un dogme que l’ADN ne reçoit pas
d’acquisitions de l’environnement ; le système phonologique de chaque
langue résiste aussi très fortement aux changements dans la longue
durée, reformule la phonétique des mots étrangers empruntés ;
l’interdit de l’inceste reste imprenable quant tous les ‘tabous’
sexuels semblent être tombés ; le nom même de refoulement dit comment
tout ce qui l’approche est englouti avec ; c’est la résistance des
paradigmes chez les usagers qui se joue contre tout essai de réforme.
Certes, ils sont susceptibles de lents changements, cela est même la
caractéristique de la modernité, mais les sociétés traditionnelles
résistent fortement au changement, cette résistance est un des rôles
des mythes et des rituels religieux. Or, il est évident que ces
répétitions automatiques ne sont pas adéquates aux scènes où leur loi
oblige à tenir compte de l’aléatoire venu d’autres assemblages
autonomes, c’est pourquoi il faut un mécanisme de régulation
qui doit être capable autant de la spontanéité de l’autonomie que dela
malléabilité rigoureuse de l’adéquation à la scène des autres, à sa loi
de circulation. Dans le cas de la voiture, plus simple parce que
sans auto-nutrition, cette régulation est assurée par l’appareil, tout
ce qui n’est pas le moteur cylindrique d’explosion. Débrayé, celui-ci
n'est que les répétitions strictes du piston, sans véritable effort.
L'embrayage et la boîte à vitesses sont des mécanismes d'oscillation
qui permettent à la machine de changer de comportement selon les
aléas du trafic, de freiner en toute vitesse, ou l'inverse,
d'accélérer quand la voie se débloque, de gagner de l'intensité, de
l'ivresse de conduire : c'est plutôt un événement par rapport à la
monotonie d'un embouteillage, toutefaite de petites répétitions.
Ces mécanismes se répètent – comme usage - chez le
conducteur de la voiture. Il a appris à régler les petites
répétitions de la machine et leurs oscillations, à gagner lui aussi
des petites répétitions automatiques dans la conduite, à devenir
lui-même une pièce de la machine, puisque ses mouvements doivent
suivre les aléas du trafic quasi machinalement, automatiquement,
presque sans faire attention, avec la spontanéité de l'habileté,
attentif à la direction à prendre, aux autres voitures, aux signaux
de la route, dans une sorte d’attention flottante, en jargon
psychanalyste, que les petites répétitions de l’appareil rendent
possible par leur automatisme. L'attention est en attente d'un
événement toujours possible ou bien à la recherche d'une intensité
de vitesse, dans un rallye ou une voiture de police poursuivant des
bandits dans un film d'action.
67.
En venant à la biologie, laissons de côté la question compliquée du
métabolisme cellulaire, pour envisager cet étonnant ‘milieu intérieur’
(Claude Bernard) que J.-D.Vincent (1986) expose et dont l’équilibre
homéostatique est le véritable enjeu de tout organisme animal, équilibre
du sang entre deux seuils : de température, de tension artérielle et
d’osmose, taux divers s’oxygène, sucre, pH, et ainsi de suite. La
routine de la respiration (qui a ses événements : rhume, toux, cigare,
course) et celle de la circulation du sang (événements : repas ou
jeûne, indigestion, infection, ivresse), cesont des petites répétitions
au service de l’alimentation de chaque cellule del’organisme, dont le
métabolisme est incessamment répétitif, en quelque sorteen retrait
strict de l’ensemble organique. On retrouve donc une régulation entre
petites répétitions et événements qui pourra nous aider à mieux
préciser,de façon fort brève, ce qui est en question dans tout retrait
régulateur :un équilibre instable, oscillant, car dépendant de la
diversité du jeu de l’aléatoire extérieur où il puise de quoi maintenir
sa stabilité. Le jeu hormonal semble être le principal mécanisme
qui veille sur cet équilibre, soit en jouant sur des organes internes,
soit en poussant à des comportements (de prédation, de fuite au
prédateur, au froid ouà la chaleur, etc). Pour y arriver, il doit
pouvoir être ‘présent’ quand il lefaut et rester ‘absent’ quand il ne
le faut pas (l’hormone qui commande la faimdeux heures et demie, à peu
près, avant que les cellules en aient besoin, doit être annulée par une
autre de satiété dès que le repas soit suffisant, là encore bien avant
que les cellules en aient bénéficié). C’est cette oscillation entre
absence et présence qui semble caractéristique de cette régulation,
l’absence étant justement un retrait disponible pour toute éventualité, à la façon de l’attention flottante de l’automobiliste.
68. Cet exemple permet de revenir au jeu du cerveau et de sa mystérieuse mémoire. Soulignons les oscillations entre l’attention
enprise sur l’événement (ou surprise par) et l’autre attention, qui
flotte surles usages de routine ; oscillation ensuite entre cette
attention de travail routinier et la relaxation de la rêverie, où l’on
se laisse aller, et encore entre celle-ci et le sommeil ; et encore,
Jouvet nous l’a appris,oscillation entre le sommeil profond ou lent et
le sommeil paradoxal des rêves. Le monde de la psychologie connaît un
éventail d’oscillations que les pathologies, la dépression par exemple,
ne font qu’étendre. D’autre part, la mémoire requise par ces
oscillations. Qui sait dire ce qu’est la mémoire ? En principe, on l’a
dit, la réponse est simple et exacte : elle ne peut être autre chose que
les graphes des synapses neuronales (Changeux), sous forme chimique,
qui est susceptible de stabilité en contrepoint avec le flux nerveux,à
électricité ionique (donc capable de chimie), qui parcourt ces
graphes, graphés d’ailleurs par la répétition de ces flux. Plus
difficile est-il de préciser un peu plus. Soit l’exemple de la langue :
quand moi, portugais, j’écris en français, où est ma mémoire de ma
langue ?[2]Et
vice-versa, quand je parle portugais, où est-il, mon français ? La
mémoire est absence. Nous savons une immensité de choses depuis que
nous avons appris à parler et sommes allés à l’école : il nous est
toutefois impossible de ‘savoir’ explicitement cet immense savoir, de
l’exposer devant nous à la façon d’une encyclopédie personnelle, il ne
vient qu’aucompte-gouttes, quand l’aléatoire d’un événement attire notre
attention et lefait ‘souvenir’. Un souvenir n’est jamais qu’un
fragment infime de cette mémoire qui sou/devient ‘présent’, l’immense
mémoire restant ‘absente’,oubliée. En retrait. Il ne vient qu’à
l’appel d’autre chose, soit même une association d’idées, selon des
règles qui nous échappent presque totalement[3],
en dehors de celles des textes, linguistiques et culturelles à la
fois, aux quelleselle obéisse, semble-t-il, et qui ont disparu des
rêves.
69.
On peut donner pour le langage des exemples semblables d’oscillations
entre petites répétitions et événements. Les phonèmes (ou les lettres)
sont des répétitions strictes, la voix qui les prononce ayant un rôle
énergétique de moteur, d’ex-pression (ou les doigts sur le clavier, d’im-pression).
Mais les phrases que l’on dit impliquent des quantités de règles de
morphologie et syntaxe, prépositions, conjonctions, accord de genre et
nombre, flexions des verbes, quenous faisons automatiquement, sans y
songer. On peut supposer que nous choisissons, très vite d’ailleurs, les
noms et adjectifs, verbes et adverbes, mais ils nous arrivent à la
bouche et à la main déjà enchaînés en phrases linguistiquement
correctes. Pourrions-nous parler s’il nous fallait faire attention à
chacune deces règles ? Ce sont les propriétés syntaxiques des verbes
analysées par M. Gross qui sortent chez chacun de nous toutes faites,
nous permettant les conversations de chaque jour avec leurs aléatoires,
permettant aussi d’écrirede vrais événements, des poèmes, de la
littérature : oscillation entre labanalité du quotidien et l’événement
de pensée.
70. Les unités sociales privées
qui sont retirées strictement, le sont pour assurer la routine
quotidienne des usages, différents selon les spécialisations, certes,
mais selon des gestes (de cuisine ou d’hygiène, écrire sur du papier,
poser des briques, ranger des boîtes, que sais-je ?) qui se répètent
partout. Cette routine, si décriée par l’idéologie de la
modernité, est toutefoisc e que toute entreprise doit assurer pour
avoir un minimum de productivité, puisque celle-ci serait nulle, ou
plutôt fort négative, si chacun devait inventer ses gestes à chaque
minute. Elle est, au contraire de ce que l’on semble souvent penser, la
condition de l’habileté et de la souplesse face à tout événement,
toute difficulté qu’il faille tourner ou résoudre plus ou moins
rapidement : de même que sur la route, quand l’accident possible se
présente,il faut dominer les petites répétitions et non point inventer
des nouveautés ! Week-ends, congés, vacances, ce sont pour ceux qui
travaillent des événements qui interrompent cette routine, comme pour
le patron la conclusion d’une bonne affaire ou, à l’inverse, une grève
de son personnel, une épidémie, une révolution.
71. Les unitéssociales, ont-elles une mémoire ? C’est justement le rôle du paradigme
de Kuhn, tel qu’il l’a défini(§ 76), si l’on l’élargit des systèmes
d’usages des laboratoires scientifiques à ceux de toute unité sociale :
ce qui, en les attirant[4], lie
les divers usagers pour accomplir les usages tels qu’on les a appris
des aînés initiés, son système de recettes en somme, mémoire sociale de
ce qu’il faut faire. Dès que le cerveau est requis, langage, usage,
apprentissage, unité sociale, la mémoire en fait partie : absence qui
devient présente de façon fragmentaire par ses effets dans la scène en
question, retrait régulateur qui rend les répétitions susceptibles d’adéquation à l’aléatoire des événements, de même que, mutatis mutandis, le jeu des hormones pour réguler l’équilibre homéostatique du sang. On ne peut plus opposer structure/événement, répétition / singulier, langue / parole, espèce, institution, société / individu et ainsi de suite : aucun de ces termes n’est qu’une forme d’oscillation entropique avec l’autre de son couple.
Définition d’assemblage : un mécanisme d’autonomie avec hétéronomie effacée
72.
On peut maintenant essayer de donner une définition phénoménologique
d’assemblage, le pendant (en chaque scène) de l’étant des philosophes.
C’est un ‘mécanisme’, ce mot disant que l’assemblage, composition de
plusieurs éléments assemblés, est doué de mouvement avec des règles ; ce
mouvement est ‘autonome’, ce qui implique que ses éléments, tout en
formant un mécanisme, soient dédoublés, agencés,liés selon deux types de
retrait, l’un interne au mécanisme, l’autre regardant la scène où il
produit des effets selon l’aléatoire de la respective circulation. Cette
‘autonomie’ est ‘donnée’ à l’assemblage par la scène elle-même, reçue
d’autres assemblages : elle est donc une ‘hétéronomie’qui se doit
d’être ‘effacée’, dissimulée, pour que l’autonomie soit ‘propre’ au
mécanisme. La donation est elle-même double : des ancêtres,
progéniteurs ou maîtres, d’une part, et d’autre part des mécanismes
incessants d’altération des assemblages, de ‘nutrition’ (biologique, de
nouveaux apprentissage,nouveaux savoirs) ; de façon générale,la donation est le fait de la scène de circulation elle-même,
qui a donné aussi ces ancêtres et donne ces ‘nutritions’, avec les
respectives énergies rendant possible la circulation de chaque
assemblage et donc la scène. On retrouve ainsi, au niveau
phénoménologique, le pendant ontique de ce que Heidegger a pensé au
niveau ontologique (on y reviendra dans la 3epartie).
73. Il y a donation avec retrait (Rdon), soit hétéronomie effacée, d’un mécanisme en double retrait, l’un strict (rstr), l’autre régulateur (rreg), qui lui rend son autonomie dans la scène. On peut formuler ainsi :
Rdon =>rstr -> rreg
où => signifie que ce qui suit est ce qui est le don, c’est-à-dire l’assemblage, et - > l’articulation indissociable des deux retraits en ‘un’ double lien, chacun impliquant une loi dont l’incompatibilité
implique le retrait strict de type (en général) énergétique par effet
de la loi qui se rapporte au jeu aléatoire de la scène. La scène est
caractérisée par le type de retraitstrict de ses assemblages : la scène à
ADN est celle de l’alimentation, la scène à unités sociales comme paradigmes d’usages est celle de l’habitation, la scène à phonèmes ou lettres est celle de l’inscription. Il nous manque pourl’instant la scène où le retrait strict est celui des noyaux atomiques, scènede la gravitation.
Ces quatre grandes scènes répondent des quatre grands domaines des
sciences et respectent leurs respectives autonomies méthodologiques.
Mais il va de soi que ces scènes sontdes déploiements les unes des
autres, à partir de celle de la gravitation, déploiements que l’on
suivra au deuxième chapitre : les lois dégagées par chaque science au
niveau de la circulation de la scène respective restent valables dans
les scènes suivantes, mais ne rendent pas compte des lois propres de la
nouvelle scène, comme les réductionnismes le voudraient.
74. Ainsi, la chimie minérale n’est pas suffisante pour
comprendre les structures dissipatives de Prigogine (§ 89) qui
relèvent de la biochimie et impliquent le niveau supramoléculairedes
cellules, permettant deux types de matière différents (§ 94-5), chacun
dépendent de sa chimie. De même, la biochimie n’est pas suffisante pour
comprendre la différence entre les cuisines des diverses sociétés, ni
la diversité des usages de celles-ci n’explique la différence de leurs
langues. Dans ces deux cas, on peut parler, comme Saussure,
d’immotivation de la nouvelle scène par rapport à celle où elle est
déployée.
75. Il y a des degrés d’indétermination au-dedans de
chacune des quatre grandes scènes, qui augmente selon l’éventail de
possibilités dont le retrait régulateur est capable, et pour ainsi dire
elle se multiplie avec le déploiement des doubles liens les unsà partir
des autres. Soit un exemple important, celui de la santé. Si l’on
regarde le triple double lien d’un mammifère, sa santé se situe dans
le deuxième, entre la proie chassée et mangée du troisième qui lui sert
de nourriture et les cellules du premier qui la recevront digérée en
molécules de carbone ; la santé correspondra ainsi à l’équilibre réussi
del’homéostasie du sang de ce mammifère. Mais le mammifère humain ne
peut le réussir sans tenir compte de son quatrième lien[5]qui
le lie aux autres usagers de son unité sociale (au pluriel dans nos
sociétés complexes), où ses envies doivent être disciplinées dans
l’exécution des usages qui lui reviennent en tant que condition
d’habitation et d’alimentation. Or, ces systèmes à plusieurs usagers,
famille, école, emploi, oscillent selon les temporalités des usages mais
aussi selon les envies de tousles autres, ce qui implique que, en
général, des parents, des maîtres ou des chefs aient un rôle régulateur
de cette discipline nécessaire et difficile. On peut parler ici d’une
certaine homéostasie écologique de l’unité sociale, dont les explosions
ou, à l’inverse, les implosions peuvent toujours mal mener chacun des
usagers, même si la nourriture ne manque pas. Les excès ou les manques
ont des incidences - ‘psychologiques’, comme on dit - sur le triple
double lien dela scène de l’alimentation et engendrent souvent des
maladies dites psychosomatiques qui ne seraient que l’effet des excès du
système d’usagers de l’unité sociale. C’est à dire, la médicine
contemporaine le sait de plus en plus, que la santé consiste dans l’équilibre entre deux homéostasies
et que l’on ne peut se limiter à netenir compte que de ‘l’organique’
et de sa chimie, à prescrire des médicaments, sans songer à des
politiques concernant le social. À la limite, la faim - qui touche le
tout premier de ces doubles liens de la santé de tout un chacun - est
le problème social primordial que devra résoudre la science économique,
la nouvelle économie politique réclamée par les récessions des années
2008-9 (§§193-203).
[1] Voir plus loin §§ 84-7.
[2] « Dans les fautes », répond, malicieuse, Wally Bourdet, qui les a corrigées.
[3]
La psychanalyse a fait jouer defaçon fort astucieuse l’association
d’idées pour en trouver quelques unes. Ces règles sont-elles des petites
répétitions ? Comme les petits vieux qui se répètent, ou
nous-mêmes, quand quelque chose nous préoccupe très fort et devenons
incapables de penser à autre chose ?
[4]Par
vocation au métier, d’une part, par le salaire nécessaire pour la
nourriture, d’autre part (pour beaucoup, hélas !, celui-ci étant le
seul qui compte).
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