quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

150. Filosofia com ciências e filosofia das ciências - genitivo subjectivo e genitivo objectivo.







LT: Há uns bons tempos que estava para pôr-te esta questão. Tentando ser simples.
Tem a ver com o genitivo subjectivo e com o genitivo objectivo na designação «filosofia das ciências».
Para o genitivo subjectivo há a filosofia inerente às ciências; para o genitivo objectivo há a filosofia sobre as ciências.
Nesta perspectiva, como é que contrapões, ou estabeleces a diferença entre a «filosofia com ciências» e  a «filosofia das ciências»? Tendo em conta que a primeira tem como um dos «motivos» decisivos de pensamento - para empregar um termo que te é caro - a investigação daquilo a que chamas «componente filosófica ocultada» («composante philosophique cachée»; no teu livro La philosophie avec sciences au XX siècle § 6) radicada fundamentalmente na cisão constitutiva da «representação» herdada do pensamento e filosofia ocidentais no séc. XVII: «a representação do objecto (exterior) no sujeito (interior), a ideia, o que pressupõe a oposição dentro / fora»? É que este aspecto tão vincado na filosofia com ciências tem alguns paralelismos com aquele, o do genitivo subjectivo da «filosofia das ciências», precisamente a filosofia ou a dimensão filosófica a elas inerente.
São questões que alguns filósofos das ciências  te poderão colocar, parece-me.
Bom Ano Novo!

30/12/2013

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FB: Bom ano também para ti.
Respondo-te para o ano.

31/12/2013

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LT: Ok, até p'ró ano!

31/12/2013

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FB: Boa questão, nunca tinha visto as coisas por esse prisma. A Filosofia das Ciências faz destas um objecto de análise filosófico (como uma Sociologia da Filosofia fará desta um objecto de análise sociológica ou uma História da Filosofia faz dela um objecto de análise histórica). Quanto à Filosofia com Ciências, é como dizes; retrabalhadas do ponto de vista da fenomenologia (Husserl, Heidegger e Derrida), elas permitem reformular esta e a filosofia dominante no Ocidente, enredada em torno do par sujeito / objecto, em clara   herança do dualismo alma / corpo, ou seja um sujeito sem corpo e oposto ao mundo, sem sociedade nem linguagem e por aí fora. As ciências que se ocupam destas questões permitem uma filosofia que as tenha em conta, permitem dar uma visão do ser no mundo heideggeriano que vai além do próprio Heidegger no ponto em que este guarda um cordão umbilical a Husserl no seu Dasein que não é constituído pelo mundo. 
Dito isto, é óbvio que a Filosofia com Ciências também pode ser Filosofia das Ciências, por exemplo quando trata do lugar do laboratório nelas, que tende a ser ignorado pela Filosofia das Ciências tradicional. Digamos que ela respeita a autonomia das várias ciências em seus laboratórios, mas questiona a relação dos seus paradigmas justamente ao mundo dos fenómenos analisados laboratorialmente. Como estas análises são sempre fragmentárias, é na sua unificação teórica e no que nela há de filosófico que a Filosofia com Ciências incide.

23/01/2014



Imagem: «Quadrângulo negro sobre fundo branco» (1913) de Kasimir Malevich




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